Um destes dias espantei-me com um homem sentado no meio do
pequeno largo. Pessoas à sua volta como se fossem pombas a rondarem um pedaço
de pão. A música oriental, o tronco nu e a posição em flor de lótus, também me
seguraram os passos, e o jovem faquir na sua plataforma de pregos afiados prendeu-me
o olhar. A rua é um circo. E um julgamento muito rápido que me fez lembrar o que
hoje se faz para se ganhar uns trocos. Deveria ter dito - sobreviver, ou viver,
quiçá. Precipitei-me no meu julgamento, e reconheço o quanto sou muitas vezes
deliberadamente apressada no meu juízo. Na verdade, o espetáculo de rua e a
dignidade de quem o cria e executa, a sua criatividade e o treino, vão muito
para além do aventar de alguém. É a coragem da exposição. É atirarem-se para a
rua e, ao primeiro olhar, confundirem-se com a infelicidade que é miséria e não
arte.
Mz
Imagem: Tela de Armanda Passos, aqui
Pintora Portuguesa, expõe desde 1976
Pintora Portuguesa, expõe desde 1976