Da minha infância, não me recordo de alguma vez me questionar sobre os valores materiais, espirituais ou de outros valores que fazem parte da formação de uma criança e por conseguinte do ser humano.
Não me recordo de, questionar Deus.
Não me recordo de, questionar Deus.
Não me recordo de, questionar Morte.
Tudo se me apresentava natural e único no meu universo de menina. E o tudo era de toda a gente.
Acreditava em fadas e em bruxas e até pensava que iria ser criança a vida toda.
Da morte não me falavam.
As pessoas morriam, eu sabia! Mas, a morte era coisa que só acontecia aos velhos.
E velhos eram aquelas pessoas enrugadas e de cabelo branco, curvadas na sua bengala também velha e de madeira antiga.
Acreditava tanto nisso, que, até mesmo a morte do meu irmão bebé não se me ocorreu como uma morte. A morte não era para seres pequeninos com poucos meses de vida.
Deus levo-o simplesmente, como um anjo, e eu até acreditava em anjos e num céu povoado por seres transparentes com asas como as nuvens.
Foi um dia estranho. O dia, foi de visitas muitas visitas como se fosse uma festa em que os sorrisos tinham sido roubados das bocas das pessoas. Havia um fotógrafo, mas o único que sorria para mim era o meu irmão bebé que permanecia imóvel numa espécie de altar feito em cima de uma mesa na sala dos meus avós.
Embora estranho, tudo foi aceite.
E depois, esqueci...
Não me recordo de se falar mais desta morte.
Um dia, ainda criança e quase adolescente fui encontrar os vivos e os mortos todos juntos num álbum enterrado no fundo de uma gaveta e, nesse mundo de mortos e de vivos que teimamos em guardar para se acaso um dia se nos varrerem da memória, lá estava ele, o meu irmão bebé a sorrir para mim.
Imagem:daqui
Com carinho
MZ