A Tia usa casaco de vison neste dia com sol de Inverno. As jóias, aparecem apenas quando leva a mão a compor a madeixa de cabelo que a laca não segura. A Tia vai falando e arrastando as vogais e algumas consoantes que compõem o seu monólogo. Acusa a agressividade da comunicação social pelo sofrimento antecipado das pessoas desta terra. Culpa-os da inquietação que atormenta os seus netos já adultos. Aconselha-os a não verem televisão, a não lerem os jornais. A Tia vai falando e ninguém a escuta. E fala e fala sozinha continuando a culpar este jornalismo exaustivo e exacerbado que até consegue destruir a esperança da maternidade. Quer bisnetos e eles não se decidem! Os seus netos pensam demais na crise, pensam demais em tudo. Têm medo do futuro. A Tia não entende, não compreende determinadas atitudes. Ela não sente a crise. Ignora que a crise toca como um rufar de tambor grave e forte que atinge as têmporas das famílias, é um trompete agudo que chega como um grito desesperado. Nada vai ser igual. Um dia é um dia, um ano é um ano. O ano que dizem agora, ninguém querer. Dois mil e doze é como um túnel pouco iluminado e ao fundo, a Tia não vê uma explosão perturbadora, apenas vê fogo-de-artifício e o brilho das suas jóias. Ignora que por aqui nada vai ficar igual.
Feliz Ano Novo, Europa!
Feliz Ano Novo, Mundo!
Escrito para FÁBRICA DE LETRAS
Tema: Crise
Imagem: Pintor impressionista
Chaim Soutine aqui
Original escrito e publicado...
Mz