quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Pose no coração.



Foi um desassossegado tempo parado em dias de confinamento. Nunca pensei fotografar pássaros num estúdio inventado - das coisas velhas, das tias - um chapeleiro que se virou ao contrário e transformou-se em bebedouro de pássaros. No frenesim, ou na lentidão das voltas das avezinhas que sobrevoavam o laranjal, um descanso de asas e o bebericar no meu chapeleiro louco. Depois, veio o desconfinamento, as lojas a abrirem e comprei um coração para dar uma graça ao meu estúdio inventado. Hoje, com o coração a desmaiar de cor, partilho estes passarinhos juvenis, crias dos que por cá passaram.


(Chapim-azul (Cyanistes caeruleus),


quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Ausências e afectos.



São tantas as ausências, que disparo da menina do olho desejos maiores do que na realidade quero. A privação inflamou uma vontade de abocanhar as minhas pessoas; apertá-las, esmagá-las como fruta de casca mole ou dura - são boas, doces, amorosas. São quem eu amo, mas de carapaça dura pelo medo. Numa fracção de segundos, transformo-me num bicho histérico sedento de tudo. Para meu bem, nem todos saberão fazer a leitura dos olhos. Deixo esse impulso de bicho, de tempos que já foram. Retorno aos olhos mansos e, a minha menina do olho inventa os beijos que ficam de baixo das máscaras. Os abraços, são caminhos de palavras.