sábado, 2 de outubro de 2010

Terra Flutuante...



Assim que poisei os pés naquela ilha, disseram-me que tinha de guardar pedras nos bolsos para não levantar voo.
Que os tremores daquele cálice de terra flutuante se confundiam com as aterragens e descolagens dos aviões...
Mar e céu, iriam confundir-se e comungar da mesma cor e, o horizonte seria sempre azul.
Chão semelhante a sapatos de defunto. Muita chuva a acentuar o cheiro químico libertado discretamente em fumos e fumarolas denunciando quão viva era esta terra.

Esperava-me chuva, vento, temperaturas amenas, muita humidade na minha pele. Alguma quietude e um genuíno medo camuflado por paisagens idílicas.
Sim...
O medo aparecia sempre que a chuva acentuava o fumegar tóxico do enxofre descendente das profundezas. Das profundezas que guardam o fogo ardente da lama incandescente. O cheiro do centro da terra que, aparentemente nos engana parecendo adormecida.
Nos primeiros dias, senti-me estonteada pela velocidade louca das nuvens.
Desisti de usar guarda-chuva, pois este voltava-se ao contrário a maior parte das vezes.

E foi quase sempre assim, debaixo de chuva miudinha que o vento me trouxe também o cheiro verde e tenrinho da erva abundante sempre renovada em rectângulos divididos por pedaços de lava.
Fusão de cheiros a terra e mar.
Mar farto e violento que galgava as escarpas negras mas que amansava junto das areias cinzentas da praia. De uma praia, onde a enseada permitia banhos mornos mesmo que a chuva teimasse em cair no Verão e de onde ninguém arredava pé, porque quando isso acontecia, todos esperávamos a visita de um arco-íris perfeito. E a chuva doce limpava-nos o sal do mar.

Recordo a Ilha dos 4 vulcões, a Ilha dos derrames de lava, dos Impérios e dos mistérios negros.
Lá onde o vento é pai de uma vegetação rara e rasteira e a Chuva é mãe da majestosa floresta rendilhada de cones quase perfeitos de criptomérias.
Lá onde a chuva tem outro encanto, os caminhos são bordados de azul e, o cheiro, é também pot-pourri de hortense.





Para:Fábrica de Letras 
Tema: "O Cheiro da Chuva"


Imagem Google:daqui





Com carinho
Mz



23 comentários:

  1. BELA PARTICIPAÇÃO. A MAGIA DAS LETRAS NOS ENVOLVE NESTE POEMA DE CHEIRO DE CHUVA MOLHADA.

    NESTES MOMENTOS NOS INTERAGIMOS COM MUITO CARINHO.
    QUE SEJA BEM VINDA A CHUVA..ESTE CHEIRO BOM E PERFUMADO CHEIRO DE TERRA MOLHADA.
    VEM COMIGO
    http://sandrarandrade7.blogspot.com/
    CARINHOSAMENTE,
    SANDRA

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  2. descreves a "ilha" tão bem, mas tão bem, que agora bateu uma nostalgia forte. Lembro-me especialmente de uma noite de Outono, em que andei a vaguear a pé pelas Furnas e rodopiei junto das cantarolas de água a ferver. O cheiro a enxofre estranha-se, mas depois entranha-se, a praia da Ribeira quente tem fumarolas que aquecem a água e é verdade, quem é de lá não usa guarda-chuva. Eu também deixei de usar. Parabéns pelo texto.

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  3. *Sandra;
    Eu escrevi em prosa, mas se te soa a poesia também não é mau:)

    Obg


    *El Matador;
    já não vou aos Açores à imenso tempo, e escrever este texto, foi um exercício de memória. Também viajei.

    Obg


    *Juana;
    não adianta mesmo, o guarda-chuva é substituído pelo impermeável e basta :)
    O cheiro do enxofre é mais acentuado quando chove, verdade?

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  4. Nunca lá estive mas pelo que se vê em filmes e fotos é LINDO.
    Gostei muito do texto e confesso que me mete muito respeito e bastante medo....a natureza quando se manifesta deixa-me inquieta!
    Medrosa é o que sou!
    xx

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  5. As ilhas são maravilhosas. Tive oportunidade de as conhecer todas.

    bj

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  6. Me pareceu estar ali.Lindo!beijos,tudo de bom,chica

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  7. Então estamos juntas, chica!

    bjos

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  8. Tão imagética e profunda tua prosa poética que consegui colher cheiros e sensações indescritíveis.
    Gostei das metáforas, das figuras.
    Um texto riquíssimo - o contexto, o estilo, o sentimento.

    Fui junto até o limite.

    Beijos.
    Ricardo

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  9. ENTÃO DEDUZO QUE ANDASTE PELA TERRA DO NUNCA...E EU QUE ESTIVE QUASE PARA IR ATÉ LÁ E COLOQUEI DE LADO A IDEIA...SURGIRAM OUTROS DESTINOS...MAS A TERRA DO NUNCA CONTINUA NA AGENDA...TALVEZ PARA UM FUTURO PRÓXIMO...

    AS TUAS PALAVRAS MÁGICAS, PERFUMADAS E DELICADAS SOAM A TECLAS DE PIANO QUE CONTRASTAM COM A CHUVA,O VENTO,O TROVÃO,O GRANIZO...O TEU LÍQUIDO É POESIA EM BRUTO QUE ESCORRE E TRANSBORDA DO TEXTO...

    BJS

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  10. Gostei de regressar aos Açores. Obrigada pela viagem.
    Beijinhos

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  11. Hum, os Açores tão bem retratados por palavras...a saudade bateu forte, já há uns anitos que não vou lá.
    Bjs

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  12. Mas dizem que é mau o cheiro do enxofre... se calhar assombra o cheiro da terra...

    Bonita participação.

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  13. Ando há tempos para visitar os Açores e ainda não consegui.O seu belo texto deu-me a provar um bocadinho do que espero encontrar.
    Obrigada.

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  14. *Ricardo Fabião;
    eu é que enriqueço sempre que o leio
    Muito obrigada
    Bjs

    *PEdras Nuas;
    faz com que a 'Terra do Nunca' seja a tua próxima realidade... espera pelo florir das hortenses e não te arrependerás.
    Bjs


    *Tulipa Negra;
    sempre que quizeres podes viajar aqui :)
    Beijinhos


    *Lilá(s)
    e não és só tu... eu também estou com vontade de lá voltar.
    Bjs


    *Johnny;
    também dizem que enquanto a Terra o libertar, é bom... evita o efeito de panela de pressão quase a explodir...

    Os Açores são ilhas maravilhosas, basta descrevê-las e teremos sempre um texto aceitável.
    Obg


    *Eduardina;
    tens de visitar, é obrigatório no roteiro das viagens :)
    Obrigada, eu!

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  15. Que bonito texto. Lindo! Soube-me bem lê-lo ao som da música.

    Os Açores devem ser mágicos.

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  16. E são Natália, acredita!
    bj

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  17. É tão fácil visualizar os Açores com este texto. Talvez por ter lá estado há duas semanas, ou então foi porque o texto me tocou...

    Beijoca!

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  18. Tocou-te porque és um 'Rafeiro' sensível e com bom gosto.
    Gostei de saber que foste aos Açores :)

    beijoca também para ti!

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  19. eu também participei,
    saudações otárias!

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  20. Os teus textos levam-me sempre a sítios estranhos, lol
    As ilhas são uma coisa de outro mundo, não tive a tua sorte de as conhecer todas, mas já levo algumas no coração.

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  21. Eu vivi lá 4 anos....tive tempo de sobra!

    E não fazia a mínima ideia de vos levar a sítios estranhos(...risos...)

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Saber que alguém me lê, é bom.
Retribuirei a vossa visita com muito gosto.Obrigada