No embalo do comboio da linha, lia o rapaz à sua paixão que
não se inibia de lhe dar beijinhos e mordidelas. O livro, muito velho,
cobria-se de capa papel pardo com título escrito à mão em duas linhas - Fialho
de Almeida – Contos. Quem o escreveu, prolongara o traço do T por toda esta
última palavra como se quisesse abraçar todo o seu conteúdo. E ia lendo páginas
em voz alta, este apaixonado romântico a fazer lembrar aqueles homens antigos. Voz
bem colocada, belo cabelo de ondas largas, bem cortado e barba espessa,
arruivada, uns pontinhos de sardas a salpicar a sua pele que era tão branca.
Ela deixou os beijinhos para se aconchegar, poisando a cabeça no seu ombro de
trovador de brinco na orelha e sorria feliz. Uns dentinhos brancos em rosto de
chocolate, olhar doce a contrastar com o vinho na cor do lenço, muito mãe
áfrica a segurar os cabelos de mil tranças. Rodeados de gente, viajavam sozinhos
naquele comboio. E eu detestei um velho senhor que incomodado, resmungava
porque tinha de escutar poemas.
- Não são poemas Senhor, são Contos de Fialho.
mz
imagem: fotografia do blogue,
Diário de Lisboa -The Lisbon Diary