Ainda há pouco estava a floresta viçosa, farta de verde. Colhi
amoras, urze, ouriço fresco de castanheiro e outras coisas que trouxe para casa
na minha bicicleta vermelha. Fiz um arranjo floral. Depois, passados poucos dias,
voltei lá. Muitas folhas perdidas pelo chão, outras a balouçarem desmaiadas em
galhos de pinheiro manso e no souto, os ouriços abertos e murchos, já vazios de
castanhas. A floresta farta de morte a mostrar como é áspera a natureza. Bestial
harmonia. O que eu queria era um chegar lento de chuva, trazendo o sol há
cavalitas. Ora o sol, ora a chuva e só de vez em quando, um vento mais forte
para secar a roupa no estendal. Já não há transição suave nem degradé de
estações. Chove a cântaros e no ondular das chamas da lareira velha, confunde-se
o trovejar dos céus com o rebentar de uma castanha ou outra. Vão inchando de
calor num inferno de brasas que se atiçam a ferro e é nesta brutalidade antiga
que hoje se declara a abertura de um bom vinho do porto.
mz
(fotografia:mz)